As nações que ameaçam boicotar a participação nos Jogos Olímpicos de Paris-2024 caso o Comité Olímpico Internacional (COI), instado nesse sentido pela Comissão dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), permita a presença de atletas da Rússia e Bielorrússia – e são já Ucrânia, Polónia, Grã-Bretanha, Dinamarca, Letónia, Lituânia, Estónia, Austrália e Japão, mas até um máximo de 40, que se vão reunir na sexta-feira, dia 10, para pressionar o ‘não’ aos Jogos caso os russos possam participar, e os bielorrussos – «pretendem tornar reféns as federações internacionais desportivas», acusou esta segunda-feira a Rússia.
A ação concertada dos governantes e instâncias desportivas de várias nações para o COI manter a suspensão (em vigor) a atletas dos dois países que, desde 24 de fevereiro de 2022, invadiram e levam a curso uma guerra na Ucrânia – mesmo que assinem uma declaração a manifestar-se contra o conflito, o que tem permitido a presença, sem bandeira e símbolos, e como neutrais, nalguns eventos de modalidades pontuais, como é o caso do ténis – e fazer orelhas moucas à recomendação da ONU para evitar a violação dos direitos humanos que constitui a ‘discriminação pela nacionalidade’ pressiona ainda mais o COI, presidido pelo antigo esgrimista alemão Thomas Bach, que entreabriu a porta à participação de atletas das nações em janeiro mas como neutrais.
Com o eventual boicote a ter cada vez mais adesões, a reação do Kremlin chegou esta segunda-feira, pela voz do ministro russo dos Desportos, Oleg Matytsin.
«Vemos como os governos de alguns países proclamam abertamente a sua interferência no processo decisório das federações internacionais e tentam tomá-las como reféns, impondo condições políticas ao boicote aos Jogos Olímpicos. Esta atitude contradiz a Carta Olímpica, desestabiliza e destruir a família olímpica», sustenta o responsável governamental da tutela de Moscovo, e do Executivo liderado por Vladimir Putin.
E foi mais claro, ao repisar o que a Comissão dos Direitos Humanos da ONU já no corrente mês indicara a um COI impossibilitado de agradar a ‘gregos’ sem desagradar a ‘troianos’, numa polémica que promete, ainda a ano e meio da competição.
«A Rússia sempre defendeu, e de forma consistente, os princípios estabelecidos na Carta Olímpica, que proíbem diretamente qualquer forma de discriminação contra os atletas», sustentou Matitsin, que viu o país suspenso pelo COI por ter violado a ‘trégua olímpica’ nos Jogos Olímpicos de inverno de Pequim-2022: a invasão da Ucrânia aconteceu num espaço temporal ainda vedado a filiados no COI, não respeitou os oito dias que as regras determinam para não se tornarem nação beligerante em qualquer conflito armado, quando invadiram a Ucrânia logo a 24 de fevereiro.
«É uma violação dos direitos humanos um atleta não poder competir só por causa do seu passaporte. Os boicotes nunca levam à prossecução de objetivos e geralmente acabam com severos castigos a várias gerações de desportistas. Em Lausana [Suíça, sede do COI], começam a compreender que não se pode organizar grandes provas internacionais sem desportistas russos. Sabemos, aliás, que a grande maioria dos membros do movimento olímpico se mostrou favorável à reintegração [da Rússia e seus atletas]», disse o ministro dos Desportos russo.
Os protestos de Matytsin foram, de pronto, rebatidos já esta segunda-feira pelo chefe da diplomacia de Kiev, Dmytro Kuleba. «O exército que comete atrocidades, assassinatos, violações e roubos. Isto é o que o ignorante COI quer permitir competir, sob bandeira branca [neutral]», recordou aos jornalistas o ministro dos Negócios Estrangeiros da Ucrânia, inflexível na posição de boicote caso atletas da Rússia e Bielorrússia possam participar.
Kuleba recordou mesmo, em defesa da sua tese, e de que caso haja atletas de Rússia e Bielorrússia a competir em Paris-2024, que «45 das 71 medalhas da Rússia nos Jogos Olímpicos de Tóquio-2020 [realizados em 2022] foram obtidas pelo CSKA, o clube do exército russo». Uma ‘bota’ para Thomas Bach e o COI descalçarem, polémica em que ainda a ‘procissão’ vai no ‘adro da igreja’.